Livros

Nas pegadas da alemoa

 “E tinha muito mais: atônitos, descobrimos que nos arquivos federais em Berlim está guardado um documento antes secreto, com o título ‘Guayana-Projekt’, no qual o especialista em Amazônia e Untersturmführer da SS, Schulz-Kampfhenkel, recomenda explicitamente a invasão e a conquista da Guiana Francesa. Para ele, não era aceitável que a Inglaterra tivesse a Guiana, com sua capital Georgetown; que a Holanda fosse dona do Suriname; nem que os franceses possuíssem a Guiana Francesa, com sua capital Caiena, enquanto a Alemanha não tinha nenhuma base naquela região tão estratégica e rica em minerais. ‘A tomada das Guianas é uma questão de primeira importância por razões político-estratégicas e coloniais’, afirma ele. Em carta ao Reichsführer da SS, Heinrich Himmler, de 26 de abril de 1940, Kampfhenkel dá ainda a receita para a fácil conquista daqueles territórios: a aliança com os indígenas e o aproveitamento das boas relações com o Brasil, cujo presidente, Getúlio Vargas, segundo ele, seria admirador de Hitler e de Mussolini.”

Na sombra do mundo perdido

No início dos anos 1990, o “búlgaro-brasileiro” Oleg Hazan e sua esposa Alice, que tinha “os olhos verdes da jaguatirica selvagem”, partem para um programa turístico de final de semana na praia do lago Caracaranã. O misterioso Monte Roraima, para o qual Sir Arthur Conan Doyle, o criador de Sherlock Holmes, imaginou uma expedição em O mundo perdido, não fica muito distante dali.

Na impossibilidade de dormir nas pousadas próximas ao lago, o casal vai até a cidade mais próxima, Normandia, onde conhecem Antônio Costa, dono da fazenda Santa Virgínia, localizada às margens do rio Surumu. A partir deste início aparentemente despretensioso, Ilko Minev entrelaça em Na sombra do mundo perdido, com invejável fôlego ficcional, a história das famílias Costa e Hazan ao longo de duas décadas. O pano de fundo é a batalha jurídica (e policial) da demarcação contínua da reserva indígena Raposa da Serra do Sol em Roraima e os violentos confrontos entre índios e colonos que ocorreram neste período.

Mas as raízes búlgaro-judaicas de Minev não permitem que este livro seja simplesmente uma trama regionalista, “amazônica”.

O destemido cosmopolitismo do narrador Oleg Hazan, de tintas autobiográficas, nos apresenta de modo igualmente afetuoso tanto a montanha Vitosha, da sua Sofia natal, quanto o amarelecido lavrado de Roraima, onde selvagens cavalos lavradeiros pastam o capim “fura-bucho”. Ao final do romance, uma calorosa, porém crítica, celebração da nossa mestiçagem cultural e linguística, o leitor não terá dúvidas que conseguiu “bamburrar” uma pedra preciosa sem ter enfrentado os perigos de estar em uma draga no rio Madeira.

Onde estão as flores?

Licco Razan é um velho vivido que quer contar a sua história para que a família entenda toda uma trajetória que começou na distante Bulgária, passou pela Turquia e foi se enraizar na Amazônia.

Minev, um imigrante que foi exilado político na Bélgica antes de vir para o Brasil e que sentiu na pele a ação terrível de um regime totalitário, além das dificuldades de fazer sua uma terra com hábitos e costumes tão diferentes, utiliza-se de uma mistura de elementos históricos com uma narrativa muito rica e fluida para criar Onde estão as flores?.

Traçando um panorama histórico da Europa, neste livro Minev descreve o até então inédito salvamento dos 50 mil judeus búlgaros, dando detalhes do fluxo migratório dos judeus para a pouco habitada Região Norte do Brasil e defendendo sem ideologismo um mundo sem guerras.

O título do livro é inspirado na canção “Where have all the flowers gone?”, eternizada por Marlene Dietrich e que se tornou uma espécie de hino contra as guerras.

A filha dos rios

Com o intuito de homenagear os habitantes da região amazônica e de preservar a história local, A filha dos rios descreve com detalhes a paisagem do mundo onde moram portugueses, italianos, espanhóis, árabes e judeus que desbravaram aquele território imenso desde o primeiro ciclo da borracha.

Na segunda metade do século XX, acompanhamos Maria, uma jovem de 16 anos e olhos verdes que, a pedido da própria mãe, Eulália, é levada de Igarapó Mirim por Adriano. Descendo pelo rio Purus, eles chegam a Surara, onde se instalam. É lá que Maria aprende a cozinhar e que o amor entre ela e Adriano aflora. Os dois seguem viagem até Manaus, onde conhecem Benjamim Melul e sua esposa, Nina. Juntos, os dois casais partem para Quatro Ases, um seringal na fronteira do Brasil com a Bolívia.

Após cinco anos, o grupo é pego por um surto de febre amarela e apenas Maria e três crianças sobrevivem. Determinada a educar seus dois filhos e Alice, a filha do casal de amigos, Maria trabalha como cozinheira em uma boate e na draga de prospecção de ouro de Oleg Hazan, um jovem judeu búlgaro.

Ilko Minev